Construção histórica cultural das pessoas com deficiência

O artigo abaixo foi escrito por Gislene Davi Ramos, do Projeto Somar Vida.
Este artigo tem como principal objetivo resgatar a construção histórica cultural das pessoas com deficiência e assim podermos entender melhor as dificuldades atuais na promoção da inclusão.
A inclusão do deficiente na sociedade sempre foi tema restrito a poucas pessoas, em geral envolvido direta e pessoalmente com a causa. A maior parte da população, com raras exceções, sempre esteve à margem das discussões e preocupações com os problemas vividos por tais pessoas.
O motivo pelo qual hoje em dia se discute a proteção das pessoas com deficiência é o índice assustador que se deve aos acidentes de trânsito, à carência alimentar e à falta de condições de higiene. Essa taxa da deficiência no Brasil, que atinge 14,5% da população, só recentemente resultou em preocupação constitucional.
Não se pode estudar o tema sem antes fazer uma breve viagem ao passado.
Na era pré-cristã, diante do fato de não saberem lidar com os corpos diferentes, a eliminação era a solução.
Na era cristã a igreja católica enxergava os deficientes como sendo a representação do pecado, portanto eram queimados na fogueira da inquisição.
No Brasil entre os séculos XVIII e XIX começaram a aparecer instituições que serviriam de depósito para as pessoas consideradas deficientes, fadadas a práticas de confinamento em hospitais e asilos, sendo este período muito violento em relação às práticas segregadoras.
No final do século XIX e meados do século XX ocorreu a criação de escolas especiais para proporcionar uma educação diferenciada aos deficientes.
Com a Constituição de 1946 a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional determinou a educação do excepcional, nas escolas públicas ou privadas sem fins lucrativos e o governo passa a investir financeiramente na educação dessas pessoas.
Em 17.10.78 o tema adquiriu status constitucional, através da Emenda n. 12 adquiriu-se, além da educação especial e gratuita, a assistência; a reabilitação; reinserção na vida econômica e social do País; a proibição de discriminação, inclusive quanto à admissão ao trabalho ou ao serviço público e salários; a possibilidade de acesso a edifícios e logradouros públicos.
Quanto à inclusão do deficiente no mercado de trabalho podemos afirmar que a Constituição de 1988, representou o início do processo de reversão dessa dura realidade, pois o Estado como “Democrático de Direito”, representa a participação de todos os indivíduos na sociedade e a redução das desigualdades sociais.
As novas diretrizes fundamentais foram: a reserva de cargos públicos, a serem preenchidos através de concurso; adaptação dos veículos de transporte coletivo; a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoas com deficiência.
Contudo o relacionamento das pessoas com deficiência se inicia, muitas vezes, com o total despreparo dos pais para receberem um filho deficiente e a criança começa a enfrentar seus primeiros problemas oriundos da rejeição.
Importante frisar que a falha, a falta, não se situa no indivíduo, mas em seu relacionamento com a sociedade. Tomemos o exemplo dos superdotados, essas pessoas possuem deficiência e não têm nenhuma falta. Pelo contrário, sua inteligência é superior à do homem comum; suas habilidades são mais aguçadas do que o padrão normal.
O indivíduo com deficiência quer por falta, quer por excesso sensorial ou motor, deve apresentar dificuldades para seu relacionamento social.
Quando se fala em deficiência, pensa-se, de imediato, naquela decorrente de problemas físicos, como a paraplegia ou a tetraplegia, ou ainda, como a surdez ou a cegueira.
Convém ressaltar que, muitas vezes, não há qualquer motivo para que uma pessoa encontre dificuldades de integração, pois não apresenta qualquer problema motor ou mental. Seria o caso dos portadores de HIV, que encontram sérias dificuldades de adaptação na sociedade.
Muitas pessoas, após sofrerem acidentes, trazem consigo marcas indeléveis, que a acompanham por toda a vida. São cicatrizes, manchas na pele, paralisias que, apesar de não produzirem qualquer dificuldade motora ou sensorial, impedem a perfeita integração do indivíduo.
Vale lembra as pessoas que apresentam grande deficiência enzimática, devendo submeter-se à dieta rigorosíssima, evitando alimentos com proteínas ou com açúcar.
Não podemos nos esquecer de que a pobreza e a deficiência estão diretamente ligadas por múltiplas razões à deficiência é tanto uma causa como uma consequência da pobreza; alguns cálculos indicam que uma em cada cinco pessoas pobres apresenta uma deficiência.
Portanto as deficiências, como foram analisadas, representam o parâmetro mais eficaz para revelar a diversidade humana, assinalando as várias formas de ser que a pessoa pode exercer, e que fogem de um padrão tradicional de ser e perceber.
Exemplos não faltam de pessoas que escrevem com os pés, comunicam-se por gestos ou expressões faciais, ouvem pela leitura labial ou por meio de recursos ou técnicas específicos, enxergam com as mãos ou com instrumentos como a bengala, ou caminham por meio de uma cadeira de rodas.
E depois de todo este contexto, percebemos que através do poder legislativo foram criadas várias leis para o benefício dos deficientes e uma suposta inclusão na sociedade.
Hoje temos até convenções internacionais sobre os direitos das pessoas com deficiência, realizada pela ONU.
Contudo não basta que tenhamos leis securitárias e trabalhistas, um exemplar sistema de compensação das desigualdades, de programas de integração do deficiente à comunidade.
É preciso que tudo isso seja efetivamente implementado através da participação ativa da sociedade civil, pois milhares de pessoas continuam à margem da vida, escondidas atrás de dificuldades e barreiras, que são mínimas e imperceptíveis para alguns, mas que se constituem em obstáculos intransponíveis nas atividades do cotidiano dos deficientes.
Para conferir eficácia plena e real ao princípio da igualdade, é sempre moderna, a lição do mestre Aristóteles, sobre a necessidade de “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que eles se desigualam”.
E finalmente deixo uma pergunta para uma reflexão.
Qual pessoa tem ideia de que um membro de sua família poderá um dia sofrer um acidente que o faça deficiente?

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